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Emoções Líquidas

Os sentimentos me invadem de forma repentina. Como aquela onda fria que toca os dedos do pé na caminhada tímida na praia, rumo ao mar. E como ondas, a sensação de preenchimento e dúvida vai ganhando meu corpo, mudando a sua temperatura, causando arrepios, expandindo a pele ao mar, doçura, choque térmico, energia cinética, informação. Inevitavelmente eu bebo sentidos estrangeiros sem sequer abrir a boca, deglutir, rir ou chorar. Apenas suspiro, como quem toma fôlego e precisa de um espaço para racionalizar aquelas informações apressadas, interpretadas pelos porões do inconsciente, deixando cada pêlo do corpo em riste.

Não foi nenhuma declaração amorosa, nenhum toque, apenas a presença e a fala. Uma fala ordinária e espontânea do cotidiano se derramou em meu interior que parece desmoronar no esforço da tradução. Uma fala e nenhuma conexão com a onda de informação. Uma fala e um cheiro na língua. Por um milésimo de segundo meu mundo estava escancarado, havia deixado as portas abertas, nenhum sistema de segurança ou alarme, eu ouvia pelo nariz, eu sabia de olhos fechados, eu apalpava com os ouvidos, eu sabia sentindo, sem palavras. Sem revelações, catarses. Eu sentia o outro. E o outro, um desconhecido casual, um transeunte em tormenta emocional que se prestou a alguns segundos de desabafo, descontentado pelo mau funcionamento do sistema de trânsito, caótico, tais quais as informações sensíveis que me transmitira.

Não me perguntem como ou porque, nem qual certeza eu tenho, pois não sei nada a respeito disso. Não posso verbalizar o que não é meu e aparece assim em mim, sem ser chamado. Eu tento ler, mas sinto-me falível, afinal será apenas uma interpretação, distante de qualquer maior verdade.

Foi assim, numa tarde quente de verão, em meio a um trânsito caótico que eu comecei a beber as pessoas.

(30/12/2014)